À medida que o debate sobre a utilização de telemóveis e outros dispositivos eletrónicos nas escolas portuguesas se intensifica, em particular com o Decreto-Lei n.º 69/2025, que visa a sua proibição nos 1.º e 2.º ciclos, um conjunto crescente de evidências internacionais alerta para os riscos de soluções simplistas.
Estudos recentes, como o estudo "Smartphone policies in schools: What does the evidence say?" de Rahali, Kidron e Livingstone (2024), e a revisão sistemática "Evidence for and against banning mobile phones in schools: A scoping review" de Campbell et al. (2024), salientam a importância de adotar abordagens equilibradas e fundamentadas, que combinem as restrições adaptadas ao contexto escolar com a educação digital crítica e o envolvimento efetivo da comunidade educativa.
A evidência internacional aponta para limitações das proibições totais
A análise de estudos internacionais permite extrair conclusões relevantes para fundamentar decisões políticas mais informadas.
Vários estudos que avaliaram o impacto de proibições totais de telemóveis nas escolas revelaram resultados inconsistentes. Embora alguns identifiquem benefícios modestos, outros não detetam quaisquer efeitos significativos no desempenho dos alunos. Neste enquadramento, a ideia de “restrição contextualizada” tende a substituir a de “proibição absoluta”, por melhor refletir a diversidade de realidades escolares (Rahali, 2024; Campbell, 2024).
Algumas investigações apontam para ligeiras melhorias no desempenho académico, sobretudo entre alunos provenientes de contextos socioeconómicos desfavorecidos, quando são aplicadas restrições ao uso dos dispositivos. Todavia, estudos com uma metodologia mais robusta não encontram qualquer correlação direta entre a proibição e a melhoria dos resultados escolares.
Apesar de algumas escolas reportarem melhorias na socialização após a restrição de telemóveis, a investigação também revela preocupações com o aumento da ansiedade e do stress entre os alunos, especialmente no período pós-pandemia. O fenómeno da nomofobia (ou seja, o medo de estar sem o telemóvel) é hoje amplamente reconhecido e afeta significativamente os jovens.
No que respeita ao ciberbullying, a exclusão dos telemóveis no espaço escolar não representa uma solução eficaz, dado que este fenómeno ocorre frequentemente fora do contexto escolar. A literatura considera, por isso, que as proibições terão um impacto limitado, sendo preferível investir na promoção de ações educativas integradas.
Quando utilizados de forma orientada e com objetivos pedagógicos bem definidos, os telemóveis podem constituir ferramentas valiosas para a aprendizagem, o desenvolvimento de competências digitais e o reforço do envolvimento dos alunos. No entanto, o seu uso deve ser sempre intencional, devidamente planeado e supervisionado.
Os especialistas defendem a implementação de políticas integradas que ultrapassem a lógica da proibição e respondam à complexidade do tema. Essas políticas devem assentar em quatro pilares fundamentais: a) promoção da literacia digital crítica; b) participação ativa da comunidade educativa; c) capacitação dos professores; e d) regularização e responsabilização das empresas tecnológicas.
Conclusão: uma decisão que exige equilíbrio, evidência e diálogo
A evidência internacional demonstra que a questão do uso dos telemóveis nas escolas é complexa e multifacetada. Por isso, uma política eficaz deverá ir além de proibições genéricas, priorizando a educação para o uso responsável, o aproveitamento pedagógico da tecnologia e a participação informada da comunidade educativa. Simultaneamente, importa exigir maior responsabilidade social dos criadores de tecnologia.